Com valores acompanhando oscilações do mercado internacional, impactos vão muito além do ato de abastecer o veículo.
De norte a sul do País, não há quem não tenha se surpreendido neste ano ao se deparar com os valores expostos nos marcadores dos postos de combustível. Difícil até falar em ‘oscilação’; afinal, o viés é praticamente só de alta.
O primeiro grande salto de 2022 ocorreu em março, quando a Petrobras anunciou aumento de 18,7% no preço da gasolina. A mudança já era esperada, já que o preço do petróleo no mercado internacional vinha em constante crescente.
A razão para isso é que, em 2016, a Petrobras implementou a Política de Paridade de Importação (PPI), pela qual os preços de produtos derivados do petróleo no Brasil acompanham diretamente o mercado internacional. Ou seja, se lá fora muda, aqui também.
“Deste modo, os aumentos, desde então, estão ligados à alta global do preço do petróleo e à desvalorização da moeda brasileira desde 2016. Assim, a junção destes dois fatores traz aumentos nos preços internos”, explica o economista e professor da Uninove, Rodrigo Mariano.
Outro agravante é a guerra, que motivou os Estados Unidos a suspenderem a importação de petróleo da Rússia – um dos principais polos de produção e exportação do combustível fóssil – fazendo disparar o preço das commodities.
O petróleo é uma commodity e tem sua cotação determinada pela oferta e demanda no mercado internacional. Portanto, elevações dos preços estão atrelados ou ao aumento da demanda do produto ou à redução da oferta.
Atualmente, os valores têm sido pressionados por fatores como a retomada da oferta pós-pandemia, levando em conta que, no período mais grave do surto, países do Oriente Médio reduziram a produção para conter a queda dos preços dos barris de petróleo.
“Tudo isso gera um cenário de incertezas que impactam a oferta e a demanda do produto, e, consequentemente, reflete nos preços”, acrescenta Mariano.
Por cerca de cinco semanas consecutivas entre março e maio o país registrou aumento no preço dos combustíveis, segundo a Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP).
E já está claro que não só a gasolina sofre os impactos. O etanol, que sempre foi uma alternativa para quem busca economizar ao abastecer o veículo, por um momento tornou-se quase a única opção viável. Mas, justamente por isso, ele também subiu.
“Devido a essa migração, há um aumento na demanda pelo etanol, o que força os preços para cima. Basicamente o que vemos aqui é a lei da oferta e lei da demanda, que consiste na relação entre preço e procura. Quando a oferta é maior que a procura, é esperado que os preços caem. Mas, quando a procura é maior que a oferta, espera-se um aumento nos preços”, explica o economista.
Outra crise que sente diretamente os reflexos desse aumento é a do desemprego. Isso porque muitas pessoas que perderam seus trabalhos, sobretudo durante a pandemia, recorreram aos aplicativos de viagens e caronas para obter/complementar a renda.
“Para aqueles que atuam em táxis, aplicativos de viagens e transporte rodoviário, houve impacto impacto direto não só com a elevação dos preços dos combustíveis, mas também de todos os produtos e serviços relacionados, como pneus, manutenção das peças automotivas, troca de óleos e filtros etc.”, analisa Mariano.
Além da dificuldade para abastecer o veículo, grande parcela da população também sofre para abastecer…o estômago. No Brasil, o preço dos combustíveis está diretamente relacionado à alimentação do consumidor.
O País é extremamente dependente da matriz rodoviária para o transporte de produtos básicos por caminhões, cujo impacto do aumento no diesel é imenso. Esse combustível também abastece maquinários agrícolas, essenciais para a produção de bens alimentícios.
“Dessa forma, o brasileiro busca alternativas para manter o consumo de determinados produtos, mas isso faz com que ele reduza ou abra mão de outros. É a necessidade de fazer escolhas diante das restrições no orçamento da família, agravado pela inflação nos últimos meses”, destaca Rodrigo Mariano.
Os automóveis protagonizaram uma verdadeira montanha russa em relação a preços, principalmente os novos e seminovos. Para se ter uma noção, em dezembro de 2021, a falta de componentes na indústria e até mesmo a crise hídrica dificultaram as vendas.
Além disso, a expectativa era de que o setor fechasse o ano registrando queda de 2,2% em relação aos novos emplacamentos, diferentemente da situação dos seminovos, cujas perspectivas eram altas, de acordo com a Federação Nacional da Distribuição de Veículos Automotores (Fenabrave).
Dessa forma, o mercado dos automóveis usados ficou aquecido sobretudo pela falta de veículos novos nas concessionárias. Ao avaliar a gama de segmentos – automóveis, motos, utilitários leves, ônibus, caminhões e implementos rodoviários – houve mais de 13.900 trocas de titulares entre janeiro e novembro do ano passado. Isso significou um aumento de 24,79% em comparação ao mesmo período de 2020.
“Em um cenário de processo inflacionário, a elevação de preços tem sido verificada em todos os setores. A alta nos preços dos automóveis 0 km fez com que o mercado de veículos usados ficasse aquecido. Isso também reflete na elevação no valor dos usados, das peças e da manutenção. É uma ação natural do mercado”, avalia Mariano.
E o que aconteceu no final de 2021 continuou pelos quatro primeiros meses de 2022. A produção de veículos leves fechou abril em queda de 0,9%, em relação ao mesmo período do ano passado. Ao todo, foram 174.340 contra 175.942 novos carros, respectivamente. No entanto, quando a comparação é com março, que fechou com 168.834 automóveis produzidos, abril registrou crescimento de 3,3%, segundo a Anfavea.
Um lugar em especial não chegou a sentir o impacto: a Autopeças Belém, que conta com três unidades em Belém (PA), localizadas nos bairros Pedreira, Conceição, e na Avenida Augusto Montenegro, uma das vias mais movimentadas da capital paraense.
Um dos balconistas da casa, Ailton Cássio Nascimento Lima, de 23 anos, afirma que o aumento nos combustíveis não afetou seus negócios como se imaginava.
“Os carros continuam quebrando, e em algumas épocas os lucros chegaram até a crescer. Então, não tivemos uma variação tão perceptível de demanda. Apesar da alta do combustível, as pessoas continuam tendo que fazer as manutenções preventivas e as trocas de óleos. Inclusive, mesmo parado, o carro, às vezes, dá problema pela falta de uso”, conta Ailton.
Mas o balconista também destaca que foi possível observar mudanças em relação ao modo de locomoção das pessoas.
“Eu não diria que os motoristas estão evitando usar carro, mas, sim, usando conforme a necessidade. Eles estão selecionando os lugares para onde realmente precisam ir de carro, levando em conta o grau de importância e a distância a ser percorrida. No fim, é tudo uma forma de conseguir economizar.”
O futuro já chegou e trouxe novo reajuste. Após quase 100 dias sem alterações nos preços, a Petrobras anunciou em 17 de junho um novo aumento para gasolina (5,18%) e diesel (14,26%). Assim, o litro da gasolina subiu para R$ 4,06, e o diesel para R$ 5,61.
Em nota, a Petrobras atribuiu a medida à situação desafiadora vivida pelo mercado global de energia em meio à recuperação da economia, mencionando também a guerra na Ucrânia.
“Não obstante, quando há uma mudança estrutural no patamar de preços globais, é necessário que a Petrobras busque a convergência com os preços de mercado”, afirma a estatal, reforçando o cumprimento da PPI.
Para o economista Rodrigo Mariano, o mercado brasileiro enfrentará muitos desafios em 2023, e lista ações necessárias para superar o cenário de inflação e desemprego.
“Reduzir a taxa de juros é necessário para estimular as pequenas e médias empresas a investir e buscar crédito para expandir seus negócios e gerar emprego e renda. Além disso, os programas assistenciais à população de baixa renda são fundamentais em um momento como este.”
Por fim, em relação às expectativas para o preço dos combustíveis nos próximos anos, o Mariano considera uma árdua tarefa, pois depende de uma combinação entre diversos fatores em escala mundial.
“Para 2023, por exemplo, há um movimento dos países europeus para reduzir a dependência de consumo de petróleo russo. Isso eleva a demanda por petróleo de outros produtores, podendo forçar os preços para cima. Desse modo, qualquer conflito entre países produtores ou grandes consumidores de petróleo é capaz de intervir no mercado.”
Esta reportagem também se encontra na Revista Balconista S/A – Edição 33. Clique aqui para ler o material completo.
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