De balconista a empresário

 De balconista a empresário

Aos 59 anos e com mais de 40 de profissão, Milton Nishioka acredita que, em matéria de carro, já aprendeu de tudo um pouco. Desde o começo de sua carreira no ramo automobilístico, quando trabalhou numa oficina mecânica, o conhecimento foi se acumulando e permitiu que ele entendesse cada detalhe na construção e manutenção dos carros. “O Fusca, por exemplo, eu sei quais são e onde ficam as peças, como se deve fazer para montar e desmontar. E não sou só eu, não. Eu e todos os bons mecânicos e bons balconistas da velha guarda. Se você fosse bom de verdade, você tinha que saber o passo-a-passo, senão você não era nada”, explica, com orgulho.

Conhecimento. Na opinião de Milton, essa é a palavra-chave para o sucesso na profissão. E amor, claro. Para ele, as duas coisas devem caminhar juntas, ou melhor, devem se atrair. “Antigamente, eu acho que as pessoas tinham mais amor nas profissões, se preocupavam menos com a remuneração. E isso fazia com que elas tivessem mais interesse também. Interesse por conhecer mais, por passar mais tempo naquilo”, diz.

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Por conta desse amor à profissão que ele conseguiu evoluir. Mesmo tendo passado por algumas outras profissões, era entre os carros que, no fim, ele deveria ficar. Depois de quase 15 anos de trabalho, Milton conseguiu um sócio para abrir seu primeiro negócio. E foi a partir de então que ele viu os frutos da sua dedicação.

Não é que a remuneração não é importante. Ela é, mas não pode ser o primeiro foco. O cara tem que entender que ela vem com o tempo, com o destaque que vai chegar com o reconhecimento das habilidades dele, do conhecimento, mais uma vez

Uma das coisas mais importantes que aprendeu ao longo desse tempo atrás do balcão foi a se relacionar com o cliente. A comunicação, ele diz, é uma das peças-chave para a venda, porque “é o jeito de trazer o cliente para você, para perto”.

“A coisa mais importante que um balconista ou um dono de loja pode ter é a fidelidade dos seus clientes”. E essa fidelidade leva tempo, como todo relacionamento. “Por isso é importante o tempo na profissão. Não só para saber tudo, sobre várias áreas, mas para estreitar sua relação com os clientes, com os mecânicos”.

E essa comunicação, por mais contraditório que possa parecer, se enfraqueceu com a internet. Hoje, boa parte das etapas das vendas pode ser feita online. O cliente pode comprar pelo computador, o dono da loja pode fazer sua encomenda por e-mail e o balconista, por sua vez, pode se informar sobre tudo por meio da tela.

“Se eu tivesse meus dezoito anos, é claro que iria buscar a informação na internet, mas é preciso saber usar”. O alerta de Milton se dá porque ele acredita que o computador, ao mesmo tempo em que possui todas as informações instantaneamente, gera uma dispersão por parte das pessoas. Por isso, “o melhor jeito é ir em busca, bater na porta das oficinas, conversar com os mecânicos. O melhor conhecimento é aquele que você pode pegar”.

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O melhor jeito é ir em busca, bater na porta das oficinas, conversar com os mecânicos. O melhor conhecimento é aquele que você pode pegar

Mas nem sempre as portas para o conhecimento estão assim escancaradas para os balconistas. Seu Milton acredita que essa dificuldade de acesso ao conhecimento é um problema do próprio sistema das vendas, da própria indústria. Para ele, é fundamental que o gerente ou o dono da loja cobre a participação dos balconistas em todas as etapas da negociação. “É ele que vai dizer para o cliente o que ele pode usar. Ele que vai influenciar a compra do mecânico. Ele tem o poder porque o mecânico pode pedir uma determinada peça que não tenha, mas só o conhecimento vai permitir que o vendedor tome a iniciativa correta e ofereça outro produto da mesma qualidade. Por isso, ele deveria conhecer muito mais que o mecânico, para sempre estar um passo à frente”.

E para adquirir um conhecimento à altura de um mecânico, o balconista precisa ter paciência. “Em minha opinião, hoje existem poucos mecânicos de verdade. Não estou falando só de ‘trocador de peça’, mas de mecânicos mesmo, que conhecem de verdade todas as etapas de montagem de um carro até, por exemplo, o funcionamento da injeção”. Entretanto, como tudo, essa tal velha guarda também pode cair em armadilhas.

Para Milton, experiência antiga vale muito, mas tem muita gente que parou no tempo, que não aperfeiçoou. “Esses profissionais perderam força porque precisam conhecer mais de tecnologia, dos carros novos. Tem muita gente que ainda não entrou para esse mundo”.

E por falar em mundo, se engana quem pensa que só de peças e carros vivem os balconistas. Corintiano e pai de um casal de filhos, Milton pretende usufruir muito desses anos de trabalho. Como quase todo mundo, ele espera se aposentar com uma graninha guardada para poder viajar. “Primeiro a gente tem que conhecer o nosso país. Mato Grosso eu já conheço, mas ainda quero ir na Pantaneira. Também quero conhecer outros países. Todo mundo diz que é bom, quero ver se é tudo isso mesmo, porque o Brasil, se não tivesse tanta corrupção, seria o paraíso!”, conclui.

 

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