Teimosia sob quatro rodas

Quando imaginamos um carro simples e popular, logo pensamos em um veículo sem vidro elétrico, com travas manuais e sem ar-condicionado. Só que isso é uma percepção atual. Nos anos 60, a definição perfeita de simplicidade era o Renault Teimoso.

Sem setas ou espelho retrovisor, muito menos um porta-luvas com uma portinha para guardar suas coisas – até isso já era excesso -, o Teimoso era um carro promovido pelo governo militar para ser o “veículo da população”.

Fomos recebidos por um senhor animado e simpático que nos mostrou todos os detalhes do Teimoso cinza azulado. Ele possuía um exterior que lembrava uma versão simplificada do Aston Martin de James Bond e um interior com bancos espartanos vermelhos e sem luxo algum.

Artur Vidal é o dono desse simples veículo, ano 1965. O advogado e presidente do KGC Clube de Carros Clássicos é um apaixonado por antigomobilismo. Possui uma grande coleção de veículos placa pretas, com vários modelos da Renault.

 “Esse carro é despojado de tudo que é luxo, ele não tem um cromado, ele não tem um acessório que seja parecido com o de linha. Os faróis são de globo ótico, só tem um limpador de para-brisa, mas coloquei mais um por segurança. Ele não tem espelho retrovisor, não tem pisca, só tem uma lâmpada traseira e assim vai”, diz o orgulhoso dono do Teimoso.

Insistência

Contar a história do carinho do Artur pelo Renault Teimoso é também contar a sua história relação com os carros da Renault. A preferência pela montadora francesa vem de sua juventude. “Quando eu tinha 16 anos, meu pai comprou um Renault Dauphine. E para mim foi uma loucura, com 16 anos e com aquele carro, para participar de corridas e tudo isso”.

Passou o tempo e Artur começou a colecionar os carros que marcaram sua juventude, principalmente os da Renault. “Primeiro eu fui atrás de um Dauphine, comprei um Dauphine  62, depois eu fui atrás do último Gordini, que era o Gordini Quatro, 68, mas faltava o Teimoso, ele era a cereja do bolo”.

Após uma longa procura, Artur encontrou o Renault Teimoso na internet em 2015. Antes de ser resgatado, com toda a sua teimosia, o veículo resistiu por 10 anos em uma oficina no morro do Jacarezinho, zona norte do Rio de Janeiro.

“O carro estava 50% do jeito que eu queria, quando começamos a ver e desmontar, nós vimos que tinha muitas coisas para fazer”. Por ser um homem muito detalhista, Artur queria que o veículo ficasse como o original da época.

Ele conta que diversas peças precisaram ser fabricadas. “Não eram grandes coisas, mas como eu queria que ficasse no estado perfeito, que é a minha característica começamos a fazer”. O marcador de gasolina do Teimoso não mostra o nível de combustível, só acende uma luz de aviso. Artur conta que essa foi uma das peças mais difíceis de se encontrar.

Teimosia

Para evitar uma crise durante os anos 60, o governo sugeriu para as montadoras criarem carros populares e aquecer a economia. Sob licença da Renault, a Willys-Overland começou a trabalhar no Dauphine e no Gordini que foram os primeiros veículos de passeios da montadora.

Por conta de sua suspensão, que não era adequada para as ruas brasileiras, os veículos ganharam o apelido de “Leite da Glória”, uma marca de leite em pó da época que possuía o slogan “desmancha sem bater”. Então a Willys resolveu botar seus automóveis para um teste de fogo, no autódromo de Interlagos.

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O circuito consistia em percorrer 50.000 quilômetros ininterruptos e foi nesse desafio que o nome “Teimoso” surgiu. Um modelo Gordini foi escolhido para disputar o circuito, que durou quase um mês, recebeu o famoso nome por sua resistência. No quinto dia de prova, ele capotou e ficou todoamssado, mas ainda assim superou os 22 dias de prova.

Com 600 kg, o Teimoso possui o mesmo motor de 4 cilindros e a mesma caixa de câmbio quatro marchas que o Gordini, porém por ser mais leve ele possuía um desempenho melhor que os outros veículos da época.

Persistência

Desde sua compra e restauração, o carro de Artur só traz alegria. O Renault Teimoso já ganhou diversos prêmios em concursos de carros clássicos e ostenta os prêmios nos adesivos do para brisa.

“Uma vez, uma senhora me parou e perguntou se podia entrar no carro. Ela disse que eu salvei a vida dela porque estava com uma depressão e lembrar da sua infância ajudou muito”, conta.

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O veículo possui diversas peculiaridades. Seu estepe, por exemplo, fica escondido na placa dianteira. A chave que se usa na troca dos pneus também é usada para ligar o carro se a bateria perder a força, com um funcionamento que tem como base uma manivela. Ninguém precisa empurrar o Teimoso para que ele funcione.

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